Eu acredito nas histórias.
Acredito na força que elas têm de atravessar o tempo, tocar pessoas, abrir clareiras na mente e acender boas práticas de vida e de política. As histórias que tenho escutado e partilhado são como flechas: certeiras, afiadas, carregadas de memória, sabedoria… de gente!. Voam em direção aos corações disponíveis, prontos para se deixar tocar e renovar o fazer cultural e o esperançar, esse verbo que move os que não desistem da vida coletiva.
É sob essa perspectiva que nasce este blog, A Flecha. Um canal de comunicação que se assume como instrumento político e poético de registro, reflexão e partilha. Um lugar para reunir vozes, experiências, contradições e acertos, sem temor de errar, mas com coragem de pensar juntos.
Vamos começar registrando as experiências de pareceristas que avaliam projetos culturais, mas que também são artistas, educadores, produtores, mobilizadores, gente de território e chão. É preciso dizer com todas as letras: o parecerista não é , ou não deveria ser, uma figura técnica e isolada. Ao contrário, trata-se de um trabalhador da cultura que carrega em sua trajetória múltiplas experiências, vivências acumuladas e um olhar plural sobre os caminhos possíveis da política cultural.
Sim, o processo avaliativo exige sigilo. O anonimato do parecerista, nesse contexto, cumpre uma função importante, evitando pressões e garantindo certa integridade da avaliação. Mas essa invisibilidade deve ser situacional, nunca permanente. Quando o anonimato vira regra e a figura do parecerista é ocultada de forma sistemática, produz-se uma opacidade que acaba invisibilizando o papel dessas pessoas na construção das políticas culturais, como se ele fosse um prestador de serviço pontual e descartável.
Quantos fazedores e fazedoras de cultura já não se viram diante de resultados que parecem indecifráveis, injustos ou arbitrários? Quantos já não se sentiram sozinhos, reféns de um sistema que não se explica e não se responsabiliza?
É por isso que precisamos falar sobre avaliação. E falar muito. Não apenas quando saem os resultados dos editais, na verdade esse é um momento bem delicado pra abrir um debate, mas sim, para dar continuidade. Precisamos de espaços constantes de diálogo sobre critérios, parâmetros, gestão e condução da banca de pareceristas mas também de sua importância da avaliação de todo o processo. A avaliação é parte fundamental de qualquer política pública e como tal, deve ser pensada coletivamente, com transparência e compromisso ético.
A abertura desse diálogo não fragiliza o sistema, porém, herdamos uma cultura punitiva, em que avaliação não é um tema tão bem vindo assim. Quando avaliadores têm espaço para compartilhar suas visões e se aperfeiçoar, quando gestoras e gestores públicos escutam e acolhem críticas, quando há abertura necessária para ajustes e quando proponentes compreendem com mais clareza os caminhos e os limites de um processo avaliativo, todos ganham. Ganha a democracia cultural, ganha a produção simbólica, ganham as comunidades que são o motor vivo da cultura e da arte.
Por isso, este ciclo inaugural de A Flecha é também uma convocatória: a romper silêncios, a iluminar zonas cinzentas, valorizar e compreender a importância da figura do parecerista – e a tornar a avaliação uma prática mais justa, mais compartilhada, mais crítica e mais comprometida com a construção das politicas culturais. Porque política cultural se faz com técnica, sim, mas também com ética, escuta, princípios políticos e movimentos de avançar.
Seguimos, então, te convidando a ser pensamento em movimento, flecha.
Com coragem e compromisso,
Sayonara Malta